sábado, 30 de agosto de 2014

balanço


Um adeus ainda balança os punhos da minha rede.
Punhos quebrados da violência que é romper.
Não, não disseram adeus.

Tanto imaginamos quem desamaria primeiro,
quem partiria,
como diria,
quem ficaria,
como sobreviveria.

Acho que não contavam com essa alternativa.
Separamos amando: carne, coração, pegada, picada, as palavras todas, ora confusas, ora caladas, desatino de amor pra todo lado.
Todas as paredes e todo o chão e todo o ar e todas as cortinas manchadas de amor.
Tive que sair lavando uma por uma, com lágrima e despedida fui limpando, dobrando, guardando..
todos os vermelhos precisando desbotar e resistindo.

Outro tanto de coragem foi pra esquecer aquela felicidade.
Só os dois já eram uma festa, uma alegria.
Encontravam-se os corpos na folia do desejo.
Sabiam dançar, tomar banho de mar, viajar, beijar, fazer café.
Fiz e faço fogueira, e até hoje queimo tudo que foi felicidade do nosso amor.

Um dia sonhei que a minha vida, meus sentimentos, eram um livro.
E eu ia até ela/ele e passava a página.
Era a página onde estava você comigo.
Depois que eu virava, tudo passava.
Se fosse assim, diria que às vezes bate um vento forte, de direção errante, que transpassa o santuário onde está o livro-vida, e aleatoriamente, mexe nas páginas, bagunça até encontrar nós dois juntos de novo, nessa história.
Páginas antigas, páginas passadas, pois nunca mais serão escritas assim.

Nenhuma delas deixou de amar, quando se separaram.
Afogamos no vômito do amor abusivo. Sufocamos em corda forte que amor sabe trançar.
O adeus que balança meu corpo nunca aconteceu, não souberam se separar com a graça simples que tiveram ao se conhecer.
Não há corpo para enterrar.
O amor em mim ainda geme as correntes.
Quero tanto que passe como quis que acontecesse. Preciso e quero seguir. Passar e não procurar com o olhar. Virar a página, escrever outros poemas e desenhar outras gravuras.

Amanhã, tentodenovo. Saio em busca de outras pistas, acredito que meu sorriso borda flores diferentes a cada nova ideia. Amanhã acordo e recomeço. Não desarmo a rede, não desisto dela, outros ventos chegarão para fazê-la em outro balanço, nasce paixão.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

você lê os meus poemas?


Construirei cápsulas de proteção que me amparem das quartas-feiras.
Serão vermelhas e rodadas, como as vestes de Iansã, minha mulher-orixá-guardiã.
E lá toda memória sofrida e pulsante-ainda vira breve esquecimento.
Minha 'brilho eterno de uma mente sem lembranças' temporária,
age às 4ªs e, passado o inventivo libertário dia, evapora-se.
Volta nas nuvens da semana seguinte,
chovendo proteção novamente sobre meus ombros, cabeça, órgãos e respiração.

Até que quarta-feira não precise mais lembrar.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

o amor e outros filmes


o tempo acerta o tempo
enquanto a chuva dessa manhã lava os ponteiros
o que não fui acumula-se em mim
em sonho
em conselhos

tudo pode ser mudado
o cenário tem a cor, a nudez e a luminosidade que damos
a vida da gente vai mudando a vida das outras pessoas
que vão mudando a vida da gente
A mistura - permito-me

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Eparrei Oyá!


Resignificar os espaços, os cantos de prazer na cidade.
Me levo a passeio.

Minha entrada no mundo foi pelo Ceará, Fortaleza.
Mas Salvador me deu a estadia. O ritmo, o movimento.
Em Fortaleza, Russas, Quixadá, Quixeramobim, as fotos da infância, que logo serão reveladas;
em Salvador, reflexões, filhos sangrados de amor, família escolhida de amigos.
Fortaleza me pariu. Salvador me empodera.

Fui ao cinema, exposição, rua, calçada, eixo. Uma partilha íntima com meu corpo ativo e outros espaços coletivos, percebo minha amplitude através dos limites do mundo.
Cada ideia nova que surge! Cada inspiração passageira de sorriso!

Essa semana resmunguei do maldito mundo que se repete - espirais me estrangulam
Hoje repito os passos, repiso, da forma mais legítima para reconhecer-me: sozinha!
Experiências que me preparam, me paramentam.
A Bianca avisa do barco voltando ao porto.
Na flutuação de quarta-feira, só aporta amor


segunda-feira, 18 de agosto de 2014

nuances


O que tinha cores fortes e traços firmes, que pintava telas enormes do tamanho do meu corpo e do meu quarto, e assinava saudade no rodapé, hoje aquarela imagens pouco nítidas, tons pasteis, presença perdida que expõe em sonhos o que não sente mais.

Sim, ainda eu. Ou em mim, a forma como esqueço, o meu jeito de rearrumar os móveis e o que sinto.

No final da temporada, marco exposição. Será uma festa, um tumulto de alegria, comemorar meus pés fincados no presente, soltar os cabelos para adiante do mundo.

Estarei viva, não há mais notícias no jornal que nos interessem mutuamente. Em mim descansará minha mãe o amor.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

sim


Eu nunca, nesse tão pouco tempo, que nem tão pouco era, entendi o que dizia
Lia e achava tão bonito como ainda acho, que nem pensava em entender
E um dia eu pensava que ia perguntar, que ia ‘saber’
Mas não deu vez, vagava o tempo no amor, era tão melhor que nunca me arrependi

As palavras não são as mesmas ditas por outras
Eu não falo o que tu falas que não falas o que eu falo
Escrever também é assim
Vou decodificando-me nas escolhas e nos perdidos, vou amando-me nos achados
E quando escrevo, estou-me dizendo do jeito maluco que mais me consigo
Sou traduzível em palavras
Pudesse, não amaria gente, só palavra de gente
Não sofreria gente,
Não viveria gente
Prefiro palavra

Não há Um Dia para tudo que eu deveria falar, e ouvir
Não há Um Dia para esquecer
E nem Outro Dia para amar
Deixar ir é abençoar viver
Amor e Gratidão

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

desfazer


As pessoas demoram a passar
Porque não é o mesmo tempo
Não se comportam nos segundos, nem nos dias
Há um mundo, tô lendo num livro*, em que “o próprio tempo não existe”.
Nunca houve mundo em que eu morasse mais do que esse, agora.

Comigo é com quem mais converso, explicando o que vou aos bem poucos entendendo
Pode ser que com a travessia da rua, uma chuva começando, já tenha descompreendido e voltado pro lugar de antes, antes do escorrego
Fixo o esquecimento enquanto lembro

Em casa, converso com as paredes.
Não há solidão, há tantas paredes, e tantos assuntos lá..
Ontem elas só me queriam falar do amor
apaguei a luz
E quem passou pelo meu mundo naquele instantes ouviu minha voz alheia a explicações,
repleta de mim,
“o tempo está depois”
(El tiempo está después - Perota Chingo)


* o livro: Hado – Mensagens Ocultas na Água, Masaru Emoto